Falando de Cinema

O Acossado, 1960

À bout de souffle (O Acossado), de Jean-Luc Godard, marcou uma viragem no cinema. Nem toda a gente gostou do seu modelo agitado, do enredo solto e do desdém pela moralidade convencional. Mas até os críticos de Godard ficaram impressionados com a sua inovação, e realizadores como Scorsese e Tarantino reconheceram a sua influência.

No filme, o pequeno bandido Michel (Jean-Paul Belmondo) mata um polícia. Esconde-se no apartamento da estudante americana Patricia (Jean Seberg), que não sabe o que ele fez. Por fim, Patricia entrega Michel à polícia, que o mata na rua. Antes de começar a realizar, Godard escrevia críticas de cinema para a revista Cahiers du Cinema e, em À bout de souffle, presta repetidas homenagens a filmes anteriores. Por exemplo, Michel idolatra Humphrey Bogart e tem um poster gigante dele na parede.

Mas, apesar de todas as suas referências, Godard e os outros jovens cineastas do que veio a ser conhecido como a Nouvelle Vague francesa, como François Truffaut e Claude Chabrol, estavam determinados a derrubar o que consideravam ser o cinéma de papa (o cinema do papá) - produções em estúdio com pouco a dizer sobre a vida moderna. Em vez disso, viam-se não apenas como realizadores, mas como autores, que criariam um novo estilo pessoal de cinema, filmando no local e abordando questões sociais difíceis.

Uma arma e uma rapariga

Godard era inflexível ao dizer que um filme não precisava de um enredo bem construído. "Tudo o que é preciso para um filme", disse ele, "é uma arma e uma rapariga". A história de À bout de souffle é vagamente baseada na história real de Michel Portail, que matou a tiro um polícia de moto em 1952 e que, tal como a personagem de Michel no filme, também tinha uma namorada americana, mas Godard escreveu o guião à medida que filmava.

O seu método de filmagem era deliberadamente caótico, filmando em ruas movimentadas de Paris, captando imagens em fuga e improvisando diálogos. Para trabalhar desta forma, precisou de filmar com uma câmara de mão e em condições de pouca luz, e é em parte isso que dá ao filme o seu aspeto monocromático de alto contraste. Também deu origem a uma nova técnica cinematográfica distinta: o jump cut.

À bout de souffle (Trailer)
Jean-Luc Godard, 1960

Corte em saltos

Anteriormente, um dos requisitos para um filme bem feito tinha sido sempre a continuidade completa entre clips filmados de diferentes ângulos ou em dias diferentes. No entanto, Godard não fez qualquer tentativa de fazer uma transição suave entre planos, juntando-os numa montagem em movimento rápido. Numa cena que segue Patricia a conduzir um carro desportivo, o fundo salta instantaneamente de um lugar para outro, à medida que diferentes planos são unidos. O jump cut tornou-se agora um elemento básico do cinema, mas na altura o crítico Bosley Crowther queixou-se de que era uma "cacofonia pictórica".

Não foram apenas os jump cuts do filme que criaram controvérsia, mas também a sua frieza. O distanciamento egocêntrico e o desprezo pela autoridade do seu jovem herói tornaram-se marcas do cinema para a nova geração. No início da década de 1960, os cineastas e o público abraçaram a rebeldia em vez do heroísmo abnegado retratado nas décadas anteriores.

Jean-Luc Godard, Realizador
Jean-Luc Godard nasceu em Paris em 1930. Aos 20 e poucos anos, juntou-se à cena dos cinemas parisienses e dedicou-se à crítica cinematográfica. Incentivado por François Truffaut, outro jovem crítico que se tornou cineasta, Godard começou a fazer os seus próprios filmes. O seu primeiro grande filme, À bout de souffle, conquistou o mundo com o seu novo estilo. Mas o trabalho de Godard logo se tornou ainda mais radical, tanto no visual – com filmes como O Desprezo, Band of Outsiders (1964) e Alphaville (1965) – quanto politicamente, em filmes como Uma Mulher Casada e Pierrot le Fou (1965). No final da década de 1960, Godard afastou-se completamente do cinema comercial, mas continuou a fazer filmes que ultrapassavam os limites do meio.